Não há que esquecer
A 20 de Junho de 1889, a Segunda Internacional Socialista, reunida em
Paris, decidiu convocar anualmente os trabalhadores para uma manifestação pela
conquista das 8 horas de trabalho diário. Em homenagem aos trabalhadores “
Mártires de Chicago” (a cidade que era o principal centro industrial dos
Estados Unidos naquela época), o dia escolhido foi o Primeiro de Maio. Em 23 de
Abril de 1919, o Senado francês aprovou a jornada diária de 8 horas e proclamou
feriado o dia 1 de Maio desse ano. No ano seguinte a Rússia adoptou o Primeiro
de Maio como feriado nacional, exemplo que foi seguido por muitos outros
países. Instituíra-se o Dia Mundial do Trabalho.
Como se chegou aqui:
Há que retroceder aos primórdios da Produção Capitalista, quando ainda eram
comuns práticas selvagens. Não apenas se procurava, desenfreadamente, a
mais-valia, através de baixos salários, como até mesmo a saúde física e mental
dos trabalhadores era comprometida por jornadas que se estendiam até 17 horas
de trabalho diário, prática comum nas indústrias da Europa e dos Estados Unidos
no final do século XVIII e durante o século XIX. Férias, descanso semanal,
cuidados de saúde, apoio à maternidade e reformas não existiam. Para se
protegerem, os trabalhadores criaram vários tipos de organização como as caixas
de auxílio mútuo, precursoras dos primeiros sindicatos.Com as primeiras
organizações, surgiram também as campanhas e mobilizações reivindicando maiores
salários e redução das horas de trabalho diário. Greves, nem sempre pacíficas,
explodiam por todo o mundo industrializado. Chicago, um dos principais pólos
industriais norte-americanos, era, também, um dos grandes centros sindicais.
Duas centrais lideravam os trabalhadores em todo o país: a AFL (Federação
Americana de Trabalho) e a Knights of Labor (Cavaleiros do Trabalho). As
organizações (centrais), sindicatos e associações, que surgiam, eram formadas
principalmente por trabalhadores de tendência socialista, anarquista e
social-democrata. Em 1886, Chicago foi palco de uma intensa greve operária. Os
trabalhadores reivindicavam melhores salários e a passagem da jornada de
trabalho de treze para oito horas diárias. À época, Chicago não era apenas o
centro da máfia e do crime organizado, era, também, o centro do anarquismo na
América do Norte, com importantes jornais operários como o Arbeiter Zeitung
e o Verboten, dirigidos respectivamente por August Spies e Michel
Schwab.As entidades patronais controlavam igualmente jornais, onde os líderes
operários eram descritos como “preguiçosos e canalhas” que só procuravam a
desordem. O Chicago Tribune foi mais longe e publicou em editorial: "Para estes vagabundos esfarrapados, a melhor comida é uma
carga de chumbo no estômago". No decorrer da greve, uma passeata
pacífica, pela Avenida Michigan, de trabalhadores no activo, desempregados e
familiares, vestindo roupas de Domingo, e empunhando cartazes onde se lia
"8 horas para trabalhar, 8 horas para
descansar e 8 horas para fazermos o que for de nossa vontade",
silenciou momentaneamente tais críticas, embora com resultados trágicos no
curto prazo. Do alto dos edifícios e nas esquinas a polícia vigiava, fortemente
armada. A passeata terminou com um comício. No dia 3, a greve continuava em
muitos estabelecimentos. Diante da fábrica McCormick Harvester, a policia
disparou contra piquetes de greve e outros operários, matando seis, deixando 50
feridos e deteve centenas. August Spies convocou os trabalhadores para uma
concentração na tarde do dia 4. O ambiente era de revolta apesar dos líderes
pedirem calma. Os oradores revezavam-se; Spies, Parsons e Sam Filiem, pediram a
união e a continuidade do movimento. No final da manifestação um grupo de 180
policiais atacou os manifestantes, espancando-os. Uma bomba explodiu no meio
dos guardas. Sessenta foram feridos e vários morreram. Chegaram reforços
policiais que começaram a atirar em todas as direcções. Morreram centenas de
pessoas: mulheres, homens e crianças. Os acontecimentos ficaram conhecidos como
A Revolta de Haymarket. A repressão foi
aumentando num crescendo sem fim: o Governo decretou o “Estado de Sítio”, e o recolher obrigatório, com a consequente
proibição de circulação pelas ruas. Milhares de trabalhadores foram presos,
muitas sedes de sindicatos incendiadas, criminosos e gangsters, pagos pelos
patrões, invadiram casas de trabalhadores, espancando-os e destruindo-lhes
bens. A justiça levou a julgamento os líderes do movimento, August Spies, Sam
Fieldem, Oscar Neeb, Adolph Fischer, Michel Shwab, Louis Lingg e Georg Engel. O
julgamento começou a 21 de Junho de 1886 e desenrolou-se rapidamente. Provas e
testemunhas foram inventadas.
Mártires de Chicago |
A sentença foi lida a 9 de Outubro. Parsons, Engel, Fischer, Lingg, Spies foram
condenados à morte por enforcamento; Fieldem e Schwab, à prisão perpétua e Neeb
a quinze anos de prisão.
Linng, ao centro na foto, não foi enforcado por ter sido encontrado morto na sua cela.
Gerou-se, então, um movimento de solidariedade internacional pressionando o governo dos Estados Unidos a realizar um novo julgamento, o que acabou por acontecer em 1888. O novo júri, entretanto constituído, reconheceu a inocência dos trabalhadores, admitiu, como provado, que fora um capitão da polícia a mandar rebentar a bomba em Haymarket, culpabilizou o Estado norte-americano e decidiu a libertação dos trabalhadores presos, incluindo os condenados a prisão perpétua.
Linng, ao centro na foto, não foi enforcado por ter sido encontrado morto na sua cela.
Gerou-se, então, um movimento de solidariedade internacional pressionando o governo dos Estados Unidos a realizar um novo julgamento, o que acabou por acontecer em 1888. O novo júri, entretanto constituído, reconheceu a inocência dos trabalhadores, admitiu, como provado, que fora um capitão da polícia a mandar rebentar a bomba em Haymarket, culpabilizou o Estado norte-americano e decidiu a libertação dos trabalhadores presos, incluindo os condenados a prisão perpétua.
Em
Portugal só a partir da Revolução dos Cravos, em 25 de Abril de 1974, é que se
voltou a comemorar o Primeiro de Maio, livremente, e este passou a ser feriado
nacional. Hoje, as duas centrais sindicais, CGTP (Central Geral dos
Trabalhadores Portugueses) e UGT (União Geral de Trabalhadores), assinalam-no,
em liberdade, com manifestações e comícios por todo o país. Durante a ditadura
salazarista do Estado Novo as comemorações eram reprimidas pela polícia.
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Os Estados Unidos, onde tudo
começou, não reconhecem, apesar disso, ainda hoje, o Primeiro de Maio como Dia
do Trabalhador. Naquele país também se celebra um Dia do Trabalhador (Labor
Day), mas isso acontece na primeira segunda-feira de Setembro. É feriado
federal (nacional), estando relacionado com o período das colheitas e com o fim
do Verão. A decisão de assim ser foi tomada pelo presidente Stephen Grover
Cleveland (Partido Democrata), por recear que a celebração em Maio reforçasse o
movimento socialista nos Estados Unidos.
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Viajar pela História deixa-nos uma certeza: lutando por
melhor, é sempre possível mudar.
Nunca desistir é lema que sigo desde sempre.
Recordo, com emoção, o 1º de Maio de 1974 em Lisboa.
Nunca vira manifestação como aquela. Vivi-a com o sentimento de ter recuperado
esse bem precioso que é a Liberdade. Chorei enquanto desfilava e ouvia os
líderes políticos regressados do exílio. Hoje, não fora a ainda impossibilidade
de caminhar como quero, voltaria à Manifestação.
Deixo-vos com palavras de Manuel Alegre:
É
possível falar sem um nó na garganta é possível amar sem que venham proibir é
possível correr sem que seja a fugir. Se tens vontade de cantar não tenhas
medo: canta. É possível andar sem olhar para o chão é possível viver sem que
seja de rastos. Os teus olhos nasceram para olhar os astros. Se te apetece
dizer não grita comigo: não. É possível viver de outro modo. É possível
transformares em arma a tua mão. É possível o amor é possível o pão. É possível
viver de pé! Não te deixes murchar. Não deixes que te domem. É possível viver
sem fingir que se vive. É possível ser homem. É possível ser livre.
( Em Portugal estamos a regressar aos primórdios da Produção
Capitalista. Na cena política portuguesa ressurgiram os vendedores de ilusões,
que nos pretendem acorrentar de novo)
Volta a ser necessário ouvir e agir:
4 comentários:
Com a revolta que este regresso ao estado Novo me provoca lhe deixo um abraço apertado e solidário, meu estimado amigo e companheiro.
Para além da memória, um apelo que te sublinho:
"Volta a ser necessário ouvir e agir"
O Meu Maio
A todos que saíram às ruas,
De corpo-máquina cansado,
A todos que imploram feriado
As costas que a terra extenua
Primeiro de Maio!
Meu mundo, em primaveras,
Derrete a neve com sol gaio.
Sou operário - este é meu maio!
Sou camponês - este é o meu mês!
Sou ferro - eis o maio que quero!
Sou terra - o maio é minha era!
Vladimir Maiakovski
Caro Carlos Albuquerque
Por qualquer razão este post tinha-me escapado.
Lucido e didáctico.
Sublinho o que o Rogério disse.
Abraço
Rodrigo
Antes tinha lido o de hoje pareceu-me perceber as metáforas.
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