Estranha história, ou talvez não!
Eduardo Cintra Torres, crítico de televisão do Público e professor da Universidade Católica escreveu a 10 de Janeiro de 2009 naquele jornal: “Crespo é hoje um verdadeiro porta-voz dos interesses informativos do Governo, um operário do agenda setting da central de propaganda.”
A 2 de Maio daquele ano, Cintra Torres voltou a falar de Mário Crespo para explicar que não cometera um erro de avaliação, mas que fora o jornalista quem dera uma cambalhota, por não lhe ter sido dado o lugar que ambicionava em Washington. Escreveu:
«Mário Crespo andou um tempão a servir a agenda do governo no seu programa Jornal das 9. A cadeira dos convidados parecia a cadeira do poder, de tanto que nela se sentaram os ministros Silva Pereira e Santos Silva. No auge desta opção editorial, o jornalista afirmou em entrevista ao Semanário Económico (15.01.09) que nas próximas eleições "provavelmente" votará (ou votaria) Sócrates; e noutra entrevista, ao CM (12.01.09), disse que "provavelmente" irá (ou iria) em breve para Washington por grandes temporadas (por coincidência, foi anunciado esta semana pelo Diário da República que o próximo conselheiro de imprensa em Washington será Carneiro Jacinto, ligado ao PS). Entretanto, a linha editorial de Crespo mudou, e de que maneira, quer no seu programa, quer nos seus artigos de opinião no Jornal de Notícias. Passou a criticar abertamente o poder PS; os ministros políticos do governo já não aquecem a cadeira do Jornal das 9. Crespo não explicou a sua radical mudança editorial (…). Mudar de opinião não é crime, nem para um lado nem para o outro, mas 180 graus é muita mudança.»
Crespo volta, agora, a ser falado por o Jornal de Notícias não ter publicado um texto seu, entendido por si como artigo de opinião, mas que não passa de uma notícia elaborada com base numa conversa de restaurante, que não ouviu, apenas lhe chegou por e-mail. Notícia a carecer de confirmação e de abertura de espaço ao contraditório, em obediência às regras jornalísticas, como lhe esclareceu o director do jornal. Não forneceu quaisquer dados. Para ele a questão era simples: ou o texto era publicado, ou deixaria de escrever para o jornal. Deixou de escrever. Soube-se, depois, que um dos intervenientes na conversa foi Nuno Santos, director de programas da SIC, tendo este afirmado, publicamente, que as coisas não se passaram como Mário Crespo as relatou.
Tudo isto acontece na véspera do lançamento de um livro de crónicas de Mário Crespo. Livro editado por Zita Seabra, antiga militante do PCP e actual deputada do PSD, com prefácio de Medina Carreira, comentador residente do programa Plano Inclinado, que o jornalista apresenta na SIC Noticias.
Curiosamente o texto não publicado pelo Jornal de Noticias veio a público no site do Instituto Sá Carneiro (PSD). Site que o jornalista disse não saber “sequer que existia”. Ainda curiosamente, Crespo não apresentou ontem o Jornal das 9 na SIC. Esteve ausente nas Jornadas Parlamentares do CDS, a convite de Paulo Portas, para, como “especialista em política internacional”, falar do ano de governo do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em quem ele não votaria, se fosse norte-americano, como o disse em entrevista.
Estranha história esta! Apenas uma certeza – o lançamento do livro de Mário Crespo vai ser de sala cheia! Tem, para já, o apoio solidário de Manuela Moura Guedes e de José Eduardo Moniz. Muita outra gente aparecerá a comprar o livro de um autor que, como ele próprio diz, deu “…aulas na Independente. A defunta alma mater de tanto saber em Portugal.”
(Conheço pessoalmente Mário Crespo. Segui com interesse muito dos seus trabalhos criticando a realidade que nos cerca. Longe estava de imaginar que um dia faria uma notícia, cujo centro é ele próprio, num olhar para o umbigo confrangedor. Notícia que quis transformar em artigo de opinião. Estará a considerar-se um iluminado?)