segunda-feira, 14 de junho de 2010

Do Viajante (Ser ou não)

O Viajante, que há muito por aqui não passa, veio hoje de visita à cubata. Chegou esguedelhado, ar fatigado (deve ter vindo de longe), barba mais crescida que da última vez. Ter-se-á apercebido, lá por onde andava, que me tenho ultimamente interrogado: já não sei se ando pelos dias, se são os dias que me percorrem. Sem me dar tempo a dizer o que quer que fosse, tirou uma folha de papel da pasta que trazia debaixo do braço esquerdo e disse-me: toma, lê. E eu li, Fernando Pessoa.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?

Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer
.
(Antes de partir o Viajante pediu-me que desejasse a todos uma boa semana)

15 comentários:

Joaquim do Carmo disse...

Brilhante a forma como introduz este filosófico poema de Fernando Pessoa.
Espero que, "sendo" em permanente devir, de ser não se canse - afinal, o lugar de ser, sendo em devir permanente, não será nunca o mesmo!
Abraço

Elaine Barnes disse...

Êita fuga!"Ser eu é nao ser" Bem,o poema está muito bem escrito e é o sentimento do autor que aqui está.Isso é importante e acima de qualquer comentário. Achei sensacional. Montão de bjs e abraços e gostaria muito que visse o meu primeiro post no bloggirls
http://asmeninasdoblog6.blogspot.com/
Ficarei bem mais feliz.

Fernanda Ferreira - Ná disse...

Querido amigo Carlos,

Fabulosa a tua introdução e o poema de Pessoa.

Fuf«gir nunca foi solução, mas entendo no contexto o que o poeta quer dizer.
Também já me senti cansada e fugi de mim, mas voltei mais forte a revigorada.

Beijinhos

Na casa do rau

Anónimo disse...

Muito original essa entrada, Carlos. Boa semana!

maria teresa disse...

O viajante "falou" como um sábio e a mim só me resta agradecer-lhe com o coração.
Abracinho

Helga Piçarra disse...

E leu muito bem. Fernando Pessoa - na minha humilde opinião - conhecia a alma humana como ninguém. Cada poema tem algo nosso, no princípio, no meio, no fim, não importa. A essência do ser está sempre presente.

Felicito o viajante, pelo momento oportuno em que se cruzou consigo.

Um beijinho :)

rosa-branca disse...

Olá amigo Carlos, passei para lhe deixar uma rosa do meu modesto jardim. Tive o cuidado de lhe tirar os espinhos. Fernando Pessoa o viajante do tempo, do seu, no nosso tempo. Beijo meu com muito carinho

Mª João C.Martins disse...

Carlos

É por estas e outras tantas razões que eu gosto muito de Pessoa. Ele conseguiu ser tão lucido na sua loucura...

Entre a vida vivida e a pensada, resta esta, a possivel, mesmo que isso, às vezes, nos dou tanto.
E sim, interrogamo-nos sempre e haverá muitos dias em que só o Viajante consegue dar-nos a resposta, sábio que é!

Um abraço

Laços e Rendas de Nós disse...

Venho agradecer a maravilhosa viagem que me proporcionou, com a sua visita, lá no meu blogue.

Viajei no tempo e sinestesias múltiplas estiveram ao alcance de cada frase lida e por si escrita.

Obrigada!

Agulheta disse...

Amigo Carlos. De volta por aqui depois de alguns dias privada deste espaço.O viajante nos deixa palavras como só ele sabia tentilhar com sua mão e caneta,as palavras que escreveu.Reparei que não consegue abrir alguns blogs! Penso que por vezes outro motor de busca seja a causa,já me aconteceu com alguns blogs,depois foi resolvido.
Beijinho de amizade Lisa

rosa dourada/ondina azul disse...

Por aqui passei e deixo um abraço!

Fernanda Ferreira - Ná disse...

Querido amigo Carlos,

Sei que não consegues entrar, mas eu tenho um selo especial para ti.
Gostava que o aceitasses.
Não sei se tens e-mail no teu perfil...eis o meu - nafer1951@gmail.com.

Beijinhos

Anónimo disse...

Carlos... Amei, me senti viajante aqui! Quanto ao livro, você vai ao dia tão almejado... Gostei demais de sua poesia inteira... assim como nesse trecho:Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

E vivo a fugir

Neve disse...

"Cavaleiro monge
Por quanto é sem fim
Sem ninguém que o conte
Caminhais em mim."


(Fernando P.)

AC disse...

É caso para dizer "viajante, volta depressa!".
Postagem muito bem conseguida!

Abraço