quarta-feira, 29 de abril de 2009

Nem de lá de fora se podia dizer a verdade!


Lembras-te?



Esta é a minha Rover 5000. Está comigo desde 1972. Muito dedilhei aquele teclado na escrita de dezenas, centenas de notícias, reportagens e crónicas, apresentadas nas rádios e jornal por onde passei, antes de chegar à Televisão. Tenho-a guardada, num espaço de memórias, na estante do escritório. Há tempos, meti-me em arrumos.
Fui dar com ela acinzentada pelo pó. Puxei-a para fora, limpei-a e abria-a, ajeitando-lhe a fita.
Via-a olhar, entre desconfiada e ciumenta, para o computador na secretária em frente. Fiz-lhe um afago e pu-la sobre o colo, como tantas vezes fizera no passado. Algumas das teclas movimentaram-se deixando ver os cursores com os caracteres. Parecia querer dizer-me estar pronta para novas batalhas. Pusemo-nos a conversar.
- Batalhas, sim! Quantas notícias, reportagens, para já não falar de crónicas, foram censuradas. Por exemplo na Rádio Renascença, lembras-te?
- Em 1972 e 1973, não foi? Lembro, pois! Recordo, como se fosse hoje a notícia que tentaste fazer sobre o golpe militar no Chile, em 11 de Setembro de 1973. A censura não deixou que dissesses ter sido derrubado o governo democrático constitucional do Chile do presidente socialista Salvador Allende, por forças da marinha e do exército chilenos, com o apoio militar e financeiro do governo dos Estados Unidos e da CIA, nele participando, também, organizações terroristas chilenas como a Pátria y Libertad de tendências neofascistas, encabeçado pelo general Pinochet, que se proclamou presidente. Nem, tão pouco, que Allende tinha sido sumariamente executado. Para a censura, o presidente chileno suicidara-se! A notícia acabou por se feita, já não sei por quem. Pelas minhas teclas não passou. Citando de memória, dizia assim: “Golpe de estado no Chile. As forças armadas chilenas derrubaram o regime de Salvador Allende, instaurando um governo militar, liderado pelo general Augusto Pinochet”.
- Avivaste-me a memória. Foi isso mesmo. Não sei se alguma vez te disse, mas na Renascença não era necessário mandar-se o que quer que fosse à censura. A estação tinha um censor residente, um executivo seu, muito cioso dos seus deveres para com a ditadura que nos oprimia!
- Desconhecia!
- E, sabes, depois do 25 de Abril, já o nosso país estava em liberdade e a caminho da Democracia, encontrei-o numa administração da RTP!
A Rover calou-se. Deixou que a fechasse e recolocasse na estante já arrumada, não sem antes voltar a olhar para o computador. Ciúmes?

2 comentários:

Anónimo disse...

eu também não sabia. conta mais.
Rosário Albuquerque

Marta disse...

Avô, encontrei mais um sítio onde foste "discutido" em comentários. Não sei se conheces, mas fica o link: http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2007/11/jonas-savimbi.html?cid=95473768