À saída do sonho
Desperta ao ouvir o silêncio da noite correr para o chilreio da madrugada. O dia chega, de manhã soalheira pela mão. Deixa a esteira do sono. Passa a porta da cubata, caminhando pela solidão áspera do seu pensamento.
E vai ao outro lado da estrada procurar o mar, seu companheiro confidente de todas as horas, amigo e amante. A ele se entrega, sempre que ali chega, oferecendo-lhe o corpo da cor da blusa do mar em noite sem Lua, deixando que lhe cheire o odor a caju, dando-lhe a beber a boca com sabor a maboque, que lhe escorre por entre os lábios.
Hoje, porém, desvia-se um pouco. Com o olhar de brilho vivo procura o trilho que a há-de levar, sabe ela, ao sítio a que os tempos se recolhem, ao local onde a terra se dilata de dentro das águas, para lá do morro de onde os escravos eram enviados para o outro lado do mar. Ela conhece a história, sangue de escravos corre por si. Não quer que a terra e o Oceano dela lhe falem, que a façam olhar para trás. Deseja, apenas, que a libertem, que lhe devolvam o pensamento solto de agruras. Porque hoje, entende, é o início de ser ela.
A terra em silêncio, e o mar de voz recolhida, escutam-na.
O tempo corre. Chega-se agora o entardecer, e, com este, uma onda maior colocando a seus pés uma flor de pétalas brilhantes. Debruça-se, recolhe a corola de cores até então para si desconhecidas. Olha-a e sorri, grande e doce, como nunca ali antes visto.
Regressa à cubata. Sem bagagem, parte no dia seguinte para não mais voltar. Com ela leva uma flor e a vontade de encontrar a pessoa nascida no sonho.
E vai ao outro lado da estrada procurar o mar, seu companheiro confidente de todas as horas, amigo e amante. A ele se entrega, sempre que ali chega, oferecendo-lhe o corpo da cor da blusa do mar em noite sem Lua, deixando que lhe cheire o odor a caju, dando-lhe a beber a boca com sabor a maboque, que lhe escorre por entre os lábios.
Hoje, porém, desvia-se um pouco. Com o olhar de brilho vivo procura o trilho que a há-de levar, sabe ela, ao sítio a que os tempos se recolhem, ao local onde a terra se dilata de dentro das águas, para lá do morro de onde os escravos eram enviados para o outro lado do mar. Ela conhece a história, sangue de escravos corre por si. Não quer que a terra e o Oceano dela lhe falem, que a façam olhar para trás. Deseja, apenas, que a libertem, que lhe devolvam o pensamento solto de agruras. Porque hoje, entende, é o início de ser ela.
A terra em silêncio, e o mar de voz recolhida, escutam-na.
O tempo corre. Chega-se agora o entardecer, e, com este, uma onda maior colocando a seus pés uma flor de pétalas brilhantes. Debruça-se, recolhe a corola de cores até então para si desconhecidas. Olha-a e sorri, grande e doce, como nunca ali antes visto.
Regressa à cubata. Sem bagagem, parte no dia seguinte para não mais voltar. Com ela leva uma flor e a vontade de encontrar a pessoa nascida no sonho.
15 comentários:
" À saída do sonho ", metáfora de mim...
Beijo
Querido amigo, ter o mar por companheiro e confidente é ter o infinito. Lindo texto...Beijocas
Feliz quem assim sai do sonho...
Inveja minha
que caminhante
pelo limiar do pesadelo
anseio por encontrar outros apóstolos e não os tenho visto...
Como gosto de ler seus textos...
Obrigada pela visita.
Grande abraço.
Parabéns pelo lindíssimo texto que tão gentilmente aqui partilha.
O sonho, o mar, a presença mágica de África e os 5 sentidos magistralmente aqui representados são os ingredientes perfeitos para uma leitura deliciosa.
Beijinhos
Saudades eu tinha da poesiade Mwata, que me transpota por paragens que não conheço, como se viajasse ao ritmo dos sonhos.
Como eu gosto destes contos!...
Beijinhos.
Eu saí do sonho e entrei na realidade e com ela parti com vontade de encontrar a pessoa que povoa os meus sonhos...
Abracinho
Querido Mwata,
É a terceira vez que passo por aqui, que me detenho na tua cubata e, parto sem deixar rasto. É que o sonho não se comenta, o sonho vive-se. E tu, Amigo, és mestre em transmitir sonhos.
Não é só o conteúdo que me fascina. É também a forma, a "marca de água" da tua escrita.
Apenas e só: OBRIGADA.
Abraço, meu Mwata.
Oi, Carlos!
Lembrei da Mensagem de Fernando Pessoa... :)
Beijos deste lado do mar.
"... sangue de escravos corre por si..." - segredos de cubatas escondidas no tempo, ninho de sonhos talvez jamais realizados!
O Mwata é uma maravilha...!
Abraço
A arte de narrar,descrevendo, é uma qualidade que em ti admiro, como escritor.
Eu "estava" por aí, em todas as sinestesias...no amor ao mar, na condenação da escravidão, de todos os tipos de escravidão...
Eu "estava"aí, na procura do SONHO...no azul florido de branco, dessas ondas alterosas...e "estava" no desaparecimento dela...na PROCURA...
BEijos de
Mª ELISA
Muito poético, o seu texto, e bem escrito.
Gostei muito
Muito poético,o seu texto.
Parabéns!
Carlos este conto faz sonhar, faz sonhar com um mundo onde a escravidão seja totalmente abolida. Presentemente ela está cada vez mais enraizada, apenas não estamos atados com correntes visíveis. Beijinhos
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