sábado, 26 de setembro de 2009

Lá vai ele!


Neste Sábado de Outono em que o hoje se está a tornar amanhã e esta em depois, ouço a poesia e a música e, de repente, vejo o Tempo a passar sem um aceno, nem sequer dizendo já volto!


Já lá vai o tempo em que o Tempo me dava tempo.

Agora, não. Já pouco me cede, e nem por empréstimo se alarga, um nico que seja, antes se encolhe.

Magoa-me, dói-me.

Para além dos padecimentos físicos, põe-se a arranjar-me outros, a ele não lhe falta o tempo para me mortificar, e passa o tempo a dissimular como um fingidor.

Ora me diz que sim, está tudo bem, abrindo-me alentos, ora me amanhece com penares e interrogações, ora me inquieta e desassossega o sono despertando-me com outros oras, roubando-me o tempo do retempero. Quer que eu caminhe sem andar, que ouça sem escutar, que veja sem enxergar, que chore sem lágrimas, que ria sem riso, que grite sem voz, que sonhe sem sonhos, que sofra com dor. Que me zangue sem ira. Que seja inútil e estéril.

Só não diz, nem disfarçando, a que tempo se irá o Tempo.

Mas, o que seria dele sem mim? Nada!

Tenho razão e coração. E ele? Falta-lhe uma coisa, desconhece a outra. Ouço e gosto de ouvir e ver. Olhar o dia, que me traz a luz, os sons e os odores lá de fora, a chegar-me de manhã pela janela semi-cerrada, às vezes de madrugada, e, quando é Primavera, a deixar-me acompanhar o esvoaçar das andorinhas à procura dos beirais, pelo ar aos arrebiques, pintando-me o carro com os seus dejectos ácidos, ou de ver o vizinho que calcorreia, rápido, a rua a caminho da nova pastelaria em busca do croissant acabadinho de sair do micro-ondas. E mesmo no Inverno, quando chove e graniza, ou a luz não é a do Sol mas a de um relâmpago. E ele? Que vê ele?

Quando choro de dor, do magoar que ele insiste em pegar-me, tenho uma mão amiga que me afaga a face, me olha nos olhos e me sustém as lágrimas. E ele?

Quem lhe dá um ombro suave para repousar a cabeça e lhe fala de coisas simples como pagar a conta da água ou do telefone, cada vez mais caras, ou prenuncia a discussão que está para chegar e não atira as zangas para amanhã, das compras a fazer vinda a bonança, ou, ainda, das férias que se hão-de gozar, dando-lhe a consciência de que ainda vive?

Andou ele, alguma vez, por poças de água de caminhos molhados. Deitou-se ele, alguma vez, no capim encharcado depois da chuva? Quando bebeu ele água das lagoas ou rios, depois de neles ter mergulhado, levando-a à boca com as mãos? E o funge, o pirão e o jindungo? Sabe ele o que são? Jogou ele, alguma vez, de pé descalço, com bola de meia enchida de trapos, na lama dos musseques?

Amou ele, alguma vez, ao luar sobre a areia da praia, arfando de amor?

Ouviu ele, alguma vez, o riso ou o choro de uma criança do mesmo sangue, mais lindos do que os brilhos das estrelas, encostada ao peito, aonde se aconchega para um sono tranquilo e seguro?

Teve ele, alguma vez, tempo para tudo isto? Não, só para me tirar o tempo!

Entre mim e ele corre tudo o que nos separa.

Quem o inventou, quem o trouxe para o meio da gente?

(publicado em Junho que o Tempo levou)


8 comentários:

uminuto disse...

Não foge o tempo, somos nós que fugimos e o pereseguimos na esperança de o anular.
Adorei esta palavras que li na passagem de um tempo que se tornou agradável através da sua leitura
um beijo e bom fds

tulipa disse...

OLÁ AMIGO CARLOS

Como pode imaginar não tenho tido muito tempo...só hoje vim à blogosfera e vim visitá-lo.
Li outros posts e vi o desafio da amiga Dulce: Quer ela saber para onde apontar um cartão vermelho. Eu digo-lhe:
Para as pessoas falsas e desligadas dos seus compromissos, falam por falar, nunca levam a sério aquilo que dizem, esquecem facilmente o que prometem...e, pela blogosfera há imensos.
Do fundo do coração estou muito desiludida...
Fiz quase 100 convites para a inauguração da minha exposição - sábado passado, dia 19...
Tou triste.

Sabe porquê?
Tantas pessoas que têm a oportunidade de ver outra cultura, outro povo através dos olhos de quem lá esteve...
será que "alguém" vai lá ver?
Daqui a 8 dias a esta hora, já está desmanchada, é uma pena...

Abraços.
Bom fim de semana.
Vamos votar todos com consciência, para que este pequenino Portugal não se deixe levar na cantiga dos que querem encher os seus próprios bolsos e esquecem-se rápido demais do que prometem nas campanhas eleitorais.

tulipa disse...

OLÁ AMIGO CARLOS

Como pode imaginar não tenho tido muito tempo...só hoje vim à blogosfera e vim visitá-lo.
Li outros posts e vi o desafio da amiga Dulce: Quer ela saber para onde apontar um cartão vermelho. Eu digo-lhe:
Para as pessoas falsas e desligadas dos seus compromissos, falam por falar, nunca levam a sério aquilo que dizem, esquecem facilmente o que prometem...e, pela blogosfera há imensos.
Do fundo do coração estou muito desiludida...
Fiz quase 100 convites para a inauguração da minha exposição - sábado passado, dia 19...
Tou triste.

Sabe porquê?
Tantas pessoas que têm a oportunidade de ver outra cultura, outro povo através dos olhos de quem lá esteve...
será que "alguém" vai lá ver?
Daqui a 8 dias a esta hora, já está desmanchada, é uma pena...

Abraços.
Bom fim de semana.
Vamos votar todos com consciência, para que este pequenino Portugal não se deixe levar na cantiga dos que querem encher os seus próprios bolsos e esquecem-se rápido demais do que prometem nas campanhas eleitorais.

FERNANDINHA & POEMAS disse...

QUERIDO CARLOS FIQUEI COM AS LAGRIMAS BAILANDOS NOS MEUS OLHOS AO LER TÃO SENSIVEL TEXTO...!

DESEJO-TE UM DOMINGO MARAVILHOSO...
ABRAÇOS DE AMIZADE,

FERNANDINHA

Graça Pereira disse...

Estou deslumbrada! Gostei deste tempo sem tempo, a não ser com tempo de te tirar todo o tempo...
Com todo o tempo do mundo um abraço para ti. Graça

Sofá Amarelo disse...

O Tempo perguntou ao Tempo quanto Tempo o Tempo tem... slogan da SIC Notícias ... pois, eu preferia viver num mundo sem Tempo, sem horas e sem minutos, apenas com um dia seguir ao outro...

Um forte abraço!!! Bom Domingo!!!

✿MIUÍKA✿ disse...

Olá amigo,tem uns textos muito bonitos,e este sobre o tempo é uma realidade.
Obrigada pelo comentário e um beijinho...MIUÍKA

Anónimo disse...

Lindo! Vou confessar que chorei! As margens deste espaço , sentei, li , reli e chorei!

Quando choro de dor, do magoar que ele insiste em pegar-me, tenho uma mão amiga que me afaga a face, me olha nos olhos e me sustém as lágrimas. E ele?

Tudo tem seu tempo, parece que este texto foi feito para mim, num tempo propício como o tempo de hoje... Ah, tempo, sagrado tempo, neste circulo eu pude ter um pouco mais de mim!