O seu eu que pensa é o mesmo a que tem batido a interrupção dos sonhos. Com ele tem andado pelas anharas sem fim, cruzando cacimbas, em segredo, na busca. Aqui e ali um ou outro rio tem visto, correndo de Sul para Norte, na procura do reencontro com a Nascente.
Num de repente deu com o Destino. Ser sem alma nem espírito como um andante, autómato, portátil, a que falta coração. Apenas um numerador onde o passado está morto. Ente sem mistério, despido de futuro.
Perdeu-se em si. Repousou. Saiu do apeadeiro.
Continuou.
Foram menos as praias do mar a que chegou, tomadas pela quietude das ondas mortas. Ter-se-ão dissipado algumas.
Indiferentes, o Sol e a Lua continuam vivendo, cada um, em casa própria.
As estrelas ainda brilham. Para além delas outros astros também. Só a luz permanece inquieta, assustada, recolhida à sombra do pensamento.
Dentro de si muitos são os seres que tem encontrado. O pensamento tomou o freio nos dentes. Feito ginete cavalga, louco, sem cavaleiro, mas de adaga no dorso.
À dor que o corpo grita, juntou-se a dor do pensar.
De novo o repouso o chamou. Foi. Deixou-se por lá ficar.
Sem saber porquê despertou. De olhos cansados como saídos da leitura de um livro, cuja última página iria fechar. Foi à janela. Viu que o Sol hoje voltou a abrir campos.
Não encerrou o livro. Deixou a última página aberta. Há-de continuar a leitura.
8 comentários:
Sempre muito agradável a sua escrita, meu amigo!
Um abraço estreito
Finalmente o viajante saiu da letargia e voltou a olhar o que por tédio ou falta de pachorra deixou passar sem ver. De vez em quando também sou viajante...e no tempo que passou o qual me continua a atormentar. A verdade é que o tempo não passa...ele fica nós é que vamos passando por ele. Hoje por exemplo, viajo sem parar pelas agruras da minha vida. Sinto-me cansada...ás vezes desejava parar, mas parar mesmo. Mas lá está se o tempo não pára e acaba por passar nós não podemos parar sem passar...e sabe Deus o quê...Beijos com carinho
Alternâncias, oscilações, devaneios de um coração, que vive um pouco de cada instante, mas se permite uma página para amanhã. Muito bom,caro xará. Um abraço.
Carlos
Li o teu texto de um fôlego.
Depois, tornei a lê-lo de forma mais lenta e, não contente, acabei por quase soletrar cada uma das palavras. E tive a "suave sensação" de te ver ali, de pé, junto daquele magnífico embondeiro, onde tinhas ficado sentado, mergulhado no tempo.
Vi que a cacimba, à água da qual te interrogavas, se transformara num livro, aberto, convidativo à leitura, porque "o Sol voltou a abrir campos".
Estou feliz com o teu regresso, sinal de que estás bem.
Carinhosamente, um beijo
Laura
"De novo o repouso o chamou. Foi. Deixou-se por lá ficar.", até despertar... Não, não encerre o livro. Um viajante nunca encerra um livro, mesmo se lido... sobretudo os que ajudam a entrar em suaves sensações.
(há muito que não tinha o prazer de lhe beber palavras suas, meu amigo)
Há um selinho para si, meu amigo, no "ematejoca azul"!!!
Independentemente da minha maldadezinha, o seu blogue, Carlos, como os dos outros dois amigos, são-me mesmo muito queridos.
Abraço da amiga de longe.
Meu amigo compreendo-o tão bem quando escreve:
"À dor que o corpo grita, juntou-se a dor do pensar."
Essa dor física e mental não o desmotiva de continuar a viagem, de apreciar o sol e escrever com esta suavidade.
Espero e desejo as suas melhoras.
beijinhos
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