Entrou por ali, por onde as margens do dia se fecharam.
Ximbicando por ela um pau de pitanga com duas palavras agarradas, que nada dizem à chegada. Mas, sabe-se, não se me pergunte de que saber. Sabe-se, só assim – andam em busca dos donos perdidos. Saltam ambas. Colam-se a um pingo batido pelo vento, que desliza ziguezagueando pela vidraça. Mais juntas, agora, xuaxalham. Diz a camba de perna curta para a outra que o não é:
- Para onde é que ela nos levava com tanta raiva?
À não camba sumiu-se-lhe a fala, emudeceu de susto. Só abre mais os olhos.
Para além do pingo agarram as duas, igualmente, a esperança de que os donos as não esqueçam.
Insiste a camba:
- Odeio, odeio quem, como essa que nos trouxe, odeia aquilo de que gosto.
A que camba não é, não abre mais os olhos. Foi-se-lhe o medo, chegou-se-lhe a voz:
- Não odeies, companheira, essa de que falas também anda, como nós, à procura, aparece sempre em busca de um dia novo, da bonança. Se te pões a odiar cegas, não vais vê-los chegar. Olha, repara. Já um ali está.
Esse não lhe vejo, não lhe conheço, nem o outro que vem atrás, diz a camba.
- Aquele, de trás, é o meu, já lhe ouvi o grito:
Vem tempestade, entra por mim!
À camba vai-se-lhe o ar, afoga-se no pingo de chuva.
Ximbicando por ela um pau de pitanga com duas palavras agarradas, que nada dizem à chegada. Mas, sabe-se, não se me pergunte de que saber. Sabe-se, só assim – andam em busca dos donos perdidos. Saltam ambas. Colam-se a um pingo batido pelo vento, que desliza ziguezagueando pela vidraça. Mais juntas, agora, xuaxalham. Diz a camba de perna curta para a outra que o não é:
- Para onde é que ela nos levava com tanta raiva?
À não camba sumiu-se-lhe a fala, emudeceu de susto. Só abre mais os olhos.
Para além do pingo agarram as duas, igualmente, a esperança de que os donos as não esqueçam.
Insiste a camba:
- Odeio, odeio quem, como essa que nos trouxe, odeia aquilo de que gosto.
A que camba não é, não abre mais os olhos. Foi-se-lhe o medo, chegou-se-lhe a voz:
- Não odeies, companheira, essa de que falas também anda, como nós, à procura, aparece sempre em busca de um dia novo, da bonança. Se te pões a odiar cegas, não vais vê-los chegar. Olha, repara. Já um ali está.
Esse não lhe vejo, não lhe conheço, nem o outro que vem atrás, diz a camba.
- Aquele, de trás, é o meu, já lhe ouvi o grito:
Vem tempestade, entra por mim!
À camba vai-se-lhe o ar, afoga-se no pingo de chuva.
(Participação no Preto e Branco - Fábrica de Letras)
17 comentários:
Olá Carlos
Que texto tão bonito, de sonoridades africanas, de palavras inventadas ou reinventadas. De onde vêm as suas palavras?
Teresa
Ainda menino aprendi o linguajar de outros meninos quimbundos, na terra africana onde me puseram para nascer. Éramos amigos e xuxualhávamos (conversávamos). Quando aparecia um cambaio (metendo os joelhos para dentro) eles diziam vem ali um camba. E, por aí fora. Fui juntando aquelas palavras às minhas. Gosto delas, com elas vivo. Quando escrevo, volta não volta, soltam-se-me algumas.
Esta bela história tem a muito a ver com o desafio, que gostava, que aceitasse, meu caro Carlos.
Veja, por favor, o "ematejoca azul". Obrigada!
Um texto muito bonito, quase um poema, muito embora o significado da palavra xuxualham me desse que fazer.
camba eu conhecia.
Um abraço e uma boa semana
Olá Carlos,
Em primeiro lugar parabéns pela sua sensibilidade literária. Um lindo texto.
Em segundo lugar - que merece mais um primeiro - boa sorte para o dia 25!!! Espero TUDO seja ultrapassado e volte como esperamos: COMPLETAMENTE CURADO. Depois ..., toca de olhar pela saúde para não voltar a ter (como disse, mais ou menos, ao amigo José) outra uma dessa lista de doenças dos catrapázios da medicina. Vire-se bem para a Natureza que ela até é amiga de verdade. Nós é que lhe somos muito ingratos.
Boa sorte.
Maria Letra
Bravo! Belíssimo! A África é sempre atraente e misteriosa. Parabéns.
BOM DIA!
Vim lhe convidar, para brindarmos juntos na festa surpresa que a Curiosa preparou para o nosso Querido a amigo João.
A champanhe já está gelando e bolo ficou uma delicia.
Venha para cá...Vamos brindar mais esta alegria em companhia do João!!!
Agora vou, tenho muitos para convidar..
Olá Carlos,
Que história interessante e com um cheiro tão forte a África!...Estou sempre à espera de novas histórias suas.
Beijinhos,
Manuela
Vim da Fábrica de Letras até aqui, e gostei do que li. Mais gostei do que ouvi. Já alguém aqui em cima falou da sonoridade das palavras que usa. pois é Carlos, muitas delas nem as conheço :), mas ainda assim sooam doces, quase como um embalo.
Cumprimentos
Gostava de saber o significado das palavras: xuxualham e camba.
Foi um prazer, que aceitasse o desafio, e será um prazer, se levar a imagem. Meu caro Carlos, pode levar tudo dos meus blogues sem perguntar e sem mencionar o meu nome.
Um abraço de um Düsseldorf chuvoso!
ematejoca,
lá em cima, na resposta à Teresa, está explicado o significado das palavras.
Por aqui também chove!
Um abraço
ematejoca,
Obrigado pela cedência da imagem.
Os créditos serão sempre incluídos, o seu a seu dono.
Irei publicar, de seguida, a resposta ao desafio.
Um abraço
Carlos Soares
Sandra
Grato pelos vossos comentários.
elvira carvalho
O xuxualhar deu assim tanto que fazer?
Um abraço a todos
Maria Letra
Foi um prazer conhecê-la. Agradeço o comentário. Quanto ao resto, há-de correr bem.
Vou conhecer o seu blog.
Manuel Freitas,
Prometo: vou tentar colocar outras histórias. Não quero que deixe de visitar a minha cubata.
Beijinhos
meldevespas,
Ainda bem que não deu por mal empregue a sua viagem. Volte. Irei conhecer o seu blog
Cumprimentos
CARLOS ALBUQUERQUE: O CHEIRO A ÀFRICA,É UMA CONSTANTE NOS TEUS TEXTOS! HOJE JÁ DESTE A EXPLICAÇÃO DE CERTAS PALAVRAS AFRICANAS, O QUE
FACILITOU A COMPREENSÃO. A ÁGUA É O GRANDE PROBLEMA DE CERTAS ZONAS DO GLOBO, ÁFRICA INCLUÍDA. PORTANTO, NÃO ADMIRA QUE ALGUÉM QUEIRA QUE A TEMPESTADE ENTRE POR SI DENTRO!
BEIJO DE LUSIBERO E QUE TUDO CORRA PELO MELHOR , CONTIGO.
Olá outra vez Carlos, muito obrigada pela visita ao meu "tasco", convido-o a visitar o meu outro lugar, onde tenho a minha participação na Fábrica:
http://meldevespas.blogs.sapo.pt/
obrigada, beijinho
Mais uma operária que se apresenta pela Fábrica. (H)
Muito bonito o texto.. novos sons aos meus ouvidos.
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