segunda-feira, 27 de julho de 2009

Dia dos Avós


Dia dos Avós
É hoje ou foi ontem?
Paulo é personagem de livro que anda às voltas para nascer. Adolescente, a meter-se nas andanças de adulto que muito trabalho lhe irão dar, chegou-se aqui e pediu para deixar uma passagem em que o narrador fala dele. Como hoje é o dia dos avós… disse com um sorriso enleante. Está bem!




Conta o narrador, a páginas tantas:

(…Paulo ouvira ao avô materno – um reformado da LAL (companhia de dar água e luz à cidade), homem sábio, de ideias frescas – que as pessoas se devem respeitar umas às outras, que a ligação de um homem e uma mulher, pelo casamento ou não, é coisa séria, de honra mesmo; que o amor nasce espontâneo, como os trevos ou a erva da pedra para o chá dos rins, entre o capim mas a felicidade, essa, temos nós que a construir com atenção para não avariar.
Gosta de o ouvir. Visita-o amiúde, encontrando-o quase sempre fixado nos cuidados com a sua criação de canários, preparando-lhes a comida com gema de ovo cozido, gotas de Vinho do Porto para lhes afinarem o canto, pastilhas de carbonato de cálcio desfeitas em pó, e outras coisas – tudo misturado num almofariz de barro vidrado –, ou de volta das rosas e cravos híbridos e matizados por enxertos que ele faz com o auxilio de um pequeno serpete, terra estrumada com bosta de pacaça e fita de nastro, dando-lhes beleza única. Cultiva-os no jardim à volta da casa, dando-lhe vida, transformando-o num deleite para quem o vê. O jardim faz amizades com facilidade, desabrocha afectos rápidos, numa relação encantada com quem por ele aparece!
Quando dá por Paulo, o avô suspende os afazeres, chama-o, explica-lhe aquelas artes, fala-lhe da vida, das gentes, com ar compenetrado de quem entende do que expõe. É um filósofo, desenha as ideias, escolhe as palavras com acerto, põe-me a pensar; que coisa aquela de não avariar a felicidade! discorre Paulo com os seus botões. O avô grita pela avó já de ouvido meio gasto, lá metida para dentro, no passajar das meias, ou a rezingar com a lavadeira no outro lado do quintal. Pede-lhe o lanche: Temos cá o neto! Há outros e outras, rebentos dos sete filhos e filhas do casal, mas só a ele trata por neto. Aos restantes chama-os pelo nome. À mesa da varanda de trás, onde se alinham em prateleiras sobrepostas a espaços e fixadas entre dois dos balaústres, as gaiolas dos canários, cada uma com o bilhete de identidade dos ocupantes, chega depressa o leite, o café, o açúcar, a canela em pó, o pão e a manteiga. O avô adoça a bebida a ferver, polvilha-a com uma pitada da especiaria e mergulha na mistura uma fatia do sustento generosamente barrada com a gordura. Paulo imita-o, deliciado. O avô até génio tem para as coisas simples de comer!
Todos deviam ter um avô pela vida fora...)

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