terça-feira, 23 de junho de 2009

Berlusconi




Abjecção






A televisão mostrou outra vez Sílvio Berlusconi. Falava para jornalistas, a propósito da generalidade da imprensa italiana mostrar fotos, bem explicitas, das orgias ocorridas numa das suas casas, comentando que nelas se incluía o consumo de cocaína, e, hoje em particular, dar à estampa a entrevista de uma senhora, de profissão prostituta, que diz ter recebido mil euros para passar uma noite com ele.
O que disse Berlusconi?
Que nada daquilo é escandaloso, escandaloso, sim, é o tirar-se fotografias com tele-objectivas, violando a privacidade das pessoas. Não fosse ele o que é e poderia dar-lhe ,eventualmente, razão. Cada qual tem direito à sua privacidade e os paparazi violam, amiúde, esse direito. Neste caso, porém, as fotos nem são de um paparazi, mas sim do repórter Antonello Zappadu do jornal espanhol “El País”. Berlusconi não colhe. Ele não pode esquecer-se que é político, figura pública e, a somar a isso, primeiro-ministro (Presidente do Conselho de Ministros, como lá se diz, à semelhança do que acontecia em Portugal no tempo de Salazar), chefe de um governo – à partida um modelo a seguir pelos seus concidadãos.
Berlusconi manda tudo isso às urtigas, faz o que lhe apetece – em Agosto de 2008 fez aprovar um novo regulamento dos voos de Estado, que passou a autorizar o transporte de diferentes categorias de passageiros, de acordo com as necessidades do chefe de governo. À luz deste regulamento foram transportados, em aviões pilotados por oficiais da Força Aérea Italiana, para a sua casa de férias artistas, bailarinos e vedetas da televisão italiana por si controlada. Berlusconi ofende quem quer (recorde-se o que fez, não há muito tempo, à chanceler alemã, apesar de pertencer à sua família política), assume-se como ser perfeito acima de tudo e de todos, inatingível. Um dia destes acabará por dizer que é Deus!
O primeiro-ministro italiano é-o com a legitimidade que lhe advém de ter sido eleito pelos italianos, sobrevivendo a várias acusações de corrupção, de ligações à Máfia, para além de ter apoiado, sem rebuços, a guerra dos Estados Unidos contra o Iraque. É um facto!
Diz a revista Forbes que é o homem mais rico de Itália e o décimo quinto mais rico do mundo (vinte mil milhões de euros, mais coisa menos coisa!). De tal poder resultou a Mediaset uma empresa que é um império na comunicação social (rádios, jornais e televisão), controlada pelo grupo Fininvest, também seu; a aquisição de um clube de futebol – o AC Milan; a propriedade de vários bancos. Correu a fundo para a política. Em 2007 dissolveu o seu partido Força Itália, perdedor de eleições anteriores com Romano Prodi e constituiu o Popolo della Libertá (Povo da Liberdade). Arrebanhou grupos nacionalistas da direita empedernida. Prometeu tudo a todos, foi a votos e ganhou. Passou a mandar na Itália.
Tudo isto acontece na Itália do Renascimento, da “descoberta do mundo do homem”, de Boccacio, da Vinci, Raffaello, Michelangelo e João XXIII. De Giuseppe Verdi e de Giuseppe Garibaldi que com a sua guerrilha e a música do compositor unificou a Itália, lutando contra invasores e tiranos, fazendo do seu país um guia da Europa e dos europeus.
No melhor pano cai a nódoa, diz o aforismo. É bem certo. Para não se recuar em demasia, na Itália já caiu Mussolini. Depois de perceberem o que ali estava, e logo que puderam, os italianos desenvencilharam-se dele da forma que se sabe. Agora, outra mancha lá caiu – Berlusconi. O que é isto?
Saramago já lhe chamou uma coisa perigosamente parecida a um ser humano.
A foto reproduzida é de Antonello Zappadu, El País

Sem comentários: